O Título de Especialista em Medicina de Família e Comunidade (TEMFC)
Prof. João Werner Falk
Ex Diretor de Titulação e Certificação da SBMFC
Cada vez mais, e nos diversos campos de atuação da medicina, os Títulos de Especialista passam a ser valorizados, inclusive com melhor remuneração e/ou como pré-requisito necessário para inscrição em concursos ou seleções públicas. Recentemente isso passou a ser mais evidente na Medicina de Família e Comunidade (MFC) do que na maioria das outras especialidades médicas, uma vez que não há mercado de trabalho na área de saúde que venha crescendo mais no Brasil do que o da Atenção Primária em Saúde (APS) – principalmente na estratégia governamental “Saúde da Família”.
Para qualquer uma das 53 especialidades médicas reconhecidas no Brasil 1, o Conselho Federal de Medicina – através dos seus Conselhos Regionais (CRMs) – só pode registrar como especialistas (concedendo o "Certificado de Registro de Qualificação de Especialista") os médicos que apresentarem pelo menos um de dois documentos: o Certificado de Conclusão de Residência Médica credenciada pela Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), ou o Título de Especialista concedido por Associação ou Sociedade Brasileira da respectiva especialidade, que seja filiada à Associação Médica Brasileira (AMB) e cujo Edital do concurso para Título de Especialista siga as normas da AMB e seja aprovado pela mesma.1 Esse é o caso da SBMFC e dos Editais de Concurso para Título de Especialista em Medicina de Família e Comunidade (TEMFC).
Residência e Título de Especialista são Certificados de natureza diferente, sendo independentes um do outro. Um médico pode ter um ou ambos, mas qualquer um deles dá direito a se registrar como especialista em um CRM. Por determinação da AMB, não é mais permitido ser concedido Título de Especialista somente por excelente currículo ou por comprovação de conclusão de Residência Médica. Agora é sempre necessário no mínimo uma prova escrita, além da análise de currículo. 2
Já os Certificados de Conclusão de Cursos de Especialização têm seu reconhecimento na academia, bem como grau de importância no mercado de trabalho e nos currículos – inclusive na etapa de análise de currículos nos Concursos para Títulos de Especialista. Mas estes Certificados não são suficientes para registro do médico como especialista nos Conselhos de Medicina.
É bom lembrar que o Código de Ética Médica, assim como normas do CFM, proíbem o médico de divulgar ser especialista em qualquer especialidade (nos cartões de visita, nos receituários, nas placas de consultório, nos convênios, etc.) sem que ele tenha o "Registro de Qualificação de Especialista" expedido por um CRM. 3
Além disso, os Títulos de Especialista valorizam o trabalho do profissional, aumentado o seu prestígio e o de sua especialidade perante os demais médicos e frente à sociedade como um todo. Isto é particularmente relevante na MFC.
Passou a época em que era freqüente alguém defender que qualquer médico – mesmo o recém formado – estaria em plenas condições de trabalhar em Atenção Primária. Hoje, em todo o mundo, a exigência é de especialistas em Medicina de Família e Comunidade (ou nomes equivalentes, conforme o país). Isto vem qualificando a APS, aumentando a resolutividade e ajudando a reorganizar os sistemas de saúde.
Considerando tudo isso, a SBMFC vem dando prioridade à organização de Concursos para Título de Especialista em MFC, tendo realizado seis concursos em pouco mais de três anos – dois dos quais policêntricos, com a aplicação de suas provas escritas, respectivamente, em dez e oito capitais, simultaneamente. Contudo, até agora (junho de 2007, com cinco concursos concluídos), somente 1442 médicos inscreveram-se e compareceram às provas e 605 conseguiram conquistar o TEMFC. Isso é muito pouco, se comparado aos mais de 30.000 médicos atuando em APS no Brasil na atualidade. Mas é parcialmente explicado pela baixa permanência, em média, dos profissionais no Programa Saúde da Família, o que faz com que a grande maioria destes raramente alcance o pré-requisito mais freqüente para se inscrever no TEMFC: quatro anos completos de prática profissional em APS, trabalhando como Médico de Família e Comunidade. O outro pré-requisito possível também é raro – Residência credenciada em MFC – e boa parte dos ex-Residentes já conseguiu o TEMFC.
Este ainda relativamente pequeno número de titulados em MFC restringe a possibilidade da maioria das cidades exigirem o registro de especialista em MFC para ingresso de médicos na APS – como alguns municípios já fazem, e como deverá ser no futuro para todos – pois haverá poucos candidatos disponíveis com este pré-requisito. Assim, é muito importante aumentar o número de titulados, sem reduzir as exigências de qualidade para aprovação no TEMFC, mas através do aumento do número de inscritos nos próximos concursos. Neste sentido, a SBMFC está neste momento realizando o seu sexto concurso (prova policêntrica, realizada em junho de 2007) e o Ministério da Saúde decidiu apoiar a SBMFC, tanto na divulgação da importância do TEMFC, quanto financeiramente, no sétimo Concurso, de forma que ele possa ter inscrições gratuitas e que sua prova objetiva, em dezembro de 2007, possa ser aplicada simultaneamente em um número ainda maior de cidades que nas duas experiências policêntricas anteriores.
Uma outra questão é que passou a existir a recertificação, a cada cinco anos, para os Títulos de Especialista de todas as especialidades médicas, obrigatório para quem se titulou a partir de janeiro de 2006 e opcional para os demais. É o chamado “Certificado de Atualização Profissional”, que somente precisará de provas para os médicos que não conseguirem um número de pontos de participação em eventos ou outras formas comprovadas de atualização profissional. Esta pontuação não é difícil de obter e estimula a educação médica continuada e a qualificação dos médicos de todas as especialidades. 4
Pesquisa baseada nos primeiros três concursos para TEMFC, relacionando as características de formação e de experiência profissional dos candidatos com seus desempenhos nesses concursos, mostrou a grande importância da Residência Médica em MFC para a formação desse especialista e a pouca efetividade de Cursos de Especialização Multiprofissionais em Saúde da Família. Evidenciou também piora do desempenho no concurso de médicos com mais idade e mais tempo transcorrido desde a graduação, evidenciando a necessidade de programas de educação médica continuada, incluindo estratégias de ensino à distância, que ajudem a superar a dificuldade das grandes distâncias em nosso país de dimensão continental. 5
O estímulo ao estudo e à atualização dos profissionais em MFC, tanto através da preparação para os mesmos conquistarem o TEMFC, como para suas recertificações de especialistas, são algumas das formas que a SBMFC tem utilizado como contribuição para uma melhor atenção à saúde da população brasileira.
Bibliografia
1. Conselho Federal de Medicina, Resolução CFM nº. 1785/2006. D.O.U. 22 de junho de 2006, Seção I, p.127. Disponível em http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2006/1785_2006.htm Acesso em 28/06/2007.
2. Associação Médica Brasileira. Normativa de Regulamentação para Obtenção de Título de Especialista ou Certificado de Área de Atuação. São Paulo, AMB, janeiro de 2004.
3. Conselho Federal de Medicina, Resolução CFM nº. 1246/1988. D.O.U. 26 de janeiro de 1988. Disponível em http://www.portalmedico.org.br/index.asp?opcao=codigoetica&portal= Acesso em 28/06/2007.
4. Conselho Federal de Medicina, Resolução CFM nº. 1.772/2005. D.O.U. 12 de agosto de 2005, Seção I , p. 141-142. Disponível em http://www.cna-cap.org.br/resolucao.php4 Acesso em 28/06/2007.
5. Falk, JW. A Especialidade Medicina de Família e Comunidade no Brasil: aspectos conceituais, históricos e de avaliação da titulação dos profissionais. [Tese de doutorado; orient. Bozzetti, MC; co-orient. Busnello, EAD]. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2005. 194 f.