Você realmente é ouvido pelo seu médico?

27 de dezembro de 2024

Por Fabiano Guimarães, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC)

Em tempos de consultas cada vez mais breves e agendas lotadas, a relação médico-paciente enfrenta desafios que vão além do campo técnico. Muitos pacientes saem dos consultórios com a sensação de que não foram plenamente ouvidos, gerando dúvidas e inseguranças sobre o tratamento proposto. O que pode ser feito para melhorar essa dinâmica?

Escutar é mais do que ouvir palavras; é interpretar sentimentos, compreender contextos e identificar necessidades que vão além do que é dito. Estudos mostram que uma comunicação eficaz entre médico e paciente pode melhorar significativamente os desfechos clínicos. Quando o paciente se sente acolhido, ele tende a confiar mais no tratamento, seguir as orientações e compartilhar informações cruciais sobre seu estado de saúde.

Por outro lado, a rotina médica, muitas vezes marcada por pressões administrativas e metas de produtividade, pode dificultar esse momento de conexão. Em um sistema de saúde que prioriza a quantidade de atendimentos, o tempo destinado a cada paciente se torna limitado, comprometendo a qualidade da interação. Além disso, o uso crescente da tecnologia nos consultórios – como prontuários eletrônicos e sistemas digitais – pode desviar a atenção do profissional, tornando a consulta ainda mais impessoal.

O paciente também tem um papel fundamental nessa relação. Apresentar seus sintomas de forma objetiva, trazer informações sobre histórico médico e fazer perguntas claras são atitudes que ajudam o médico a compreender melhor sua situação. Mais do que isso, é essencial que ele compreenda que dividir a responsabilidade pela consulta é um passo importante para um cuidado mais eficaz. Isso inclui estar disposto a seguir as orientações, praticar o autocuidado e informar ao seu médico ou sua médica sobre quaisquer dificuldades em aderir ao tratamento proposto.

O autocuidado apoiado é um conceito cada vez mais valorizado na medicina moderna. Ele envolve o engajamento ativo do paciente em sua própria saúde, mas com o suporte necessário do profissional para orientá-lo nesse processo. Essa parceria pode transformar o cuidado de saúde, permitindo ao paciente desenvolver hábitos saudáveis e maior autonomia, ao mesmo tempo que reduz os riscos de complicações e melhora os desfechos clínicos.

Dentro desse contexto, a Medicina de Família e Comunidade emerge como uma especialidade que tem entre seus princípios a escuta ativa e o cuidado centrado na pessoa. Os médicos e médicas desta área são treinados para compreender não apenas os aspectos biológicos, mas também os fatores emocionais, sociais e culturais que influenciam a saúde. Essa abordagem integrada favorece uma relação mais humana e eficaz, promovendo um cuidado que realmente faz diferença.

Em resumo, a relação médico-paciente exige esforço conjunto. O paciente precisa se sentir à vontade para expor suas queixas e assumir um papel ativo no cuidado com sua saúde, enquanto o médico deve criar um ambiente que favoreça essa troca. Afinal, ser ouvido é mais do que ter a palavra; é ter a certeza de que sua voz fez diferença, em uma parceria que promove autonomia, confiança e bem-estar.