Por Airton Tetelbom Stein*
Ocorreu no dia 2 de julho de 208, o falecimento do Professor Julian Tudor Hart, 91 anos, que foi um médico de família muito reconhecido ao publicar em 1971 “inverse care law” ( a lei do cuidado inverso), onde define que aqueles que mais necessitam os serviços de saúde tem menos acesso.
O professor Andy Haines da London School of Hygiene and Tropical Medicine apresentou-me o Professor Julian Tudor Hart. O professor Haines já estava orientando os caminhos do Serviço de Saúde Comunitária do Grupo Hospitalar Conceição (SSC do GHC) e sugeriu fortemente que eu deveria conversar com o Professor Hart.
Eu fui visita-lo a cidade de Gluncorrwg, no País de Gales em 1990, onde o Professor Hart morava. Eu estava muito interessado em desenvolver novas propostas no Serviço de SSC do GHC e a conversa com o professor Hart foi sobre a importância de enfatizar a promoção de saúde pelo médico de família. Ele também comentou sobre os determinantes sociais e o estilo de vida das pessoas e a associação com doenças crônicas não transmissíveis e sugeriu que deveria estimular a prática de pesquisa na comunidade pelo médico de família.
Há 47 anos atrás, o Professor Julian Tudor Hart escreveu um artigo na revista inglesa Lancet sobre a lei do cuidado inverso (do inglês inverse care law), no qual descreve uma relação perversa entre a necessidade do atendimento à saúde e a sua utilização. Em outras palavras, aqueles que mais necessitam de atendimento à saúde são os que menos provavelmente irão receber. Portanto, aqueles que menos necessitam do atendimento no setor saúde tendem a utilizar mais os serviços de saúde, e também acessam serviços que são mais efetivos.
A descrição desta lei ocorreu no serviço de saúde do Reino Unido, no entanto esta realidade ocorre em todos os locais, e particularmente no Brasil, onde é bem clara a constatação de iniquidade na utilização dos serviços de saúde.
O professor Julian Tudor Hart mostrou iniquidade, particularmente naquelas que tem mais vulnerabilidade onde os serviços de saúde oferecidos têm pior qualidade e também com dificuldade de acesso. Ainda que o professor Hart não demonstrou evidência para apoiar esta hipótese, vários estudos – inclusive pesquisas conduzidas no Brasil confirmam este achado.
O maior legado do professor Hart nos deixa é a importância de enfatizar o trabalho numa comunidade, valoriza o sistema de saúde universal e enfatiza a necessidade de abordar iniquidade dos serviços de saúde, onde há necessidade de desenvolver estratégias para diminuir iniquidade. No ano de 2018, o National Health Service (Sistema Nacional de Saúde do Reino Unido) está comemorando 70 anos e a lembrança dos princípios definidos pelo professor Julian Tudor Hart são ainda mais enfatizados para que possamos melhorar a qualidade dos serviços de saúde e oferecer intervenções efetivas, especialmente para as populações mais vulneráveis.
*Airton Tetelbom Stein é Médico de Família e Comunidade do Grupo Hospitalar Conceição, membro da SBMFC; Professor Titular de Saúde Coletiva da Ufcspa e Pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação da Ufcspa.