Claunara: a decisão pela MFC foi a partir de uma experiência, em um estagio de ferias da faculdade, em 1992, na Unidade Floresta do GHC, em 1992. Me formei em julho de 1994, e apesar de ter tiro uma rápida experiencia de trabalhar em uma pequena cidade do interior, por indicação de um Professor, para substituir uma casal de médicos que iria se mudar dessa cidade, a decisão por fazer residência já estava tomada. Em 1994 é lançado o PSF e o município de Porto Alegre inicia a proposta de implantação, contrata as primeiras equipes, via associação de moradores, e eu faço o processo seletivo, e entro no final da minha residência, em dezembro de 1996, para uma equipe de PSF em Porto Alegre. Ou seja, já na residência, havia oferta de trabalho para o MFC (havia feito um concurso em uma cidade do interior, Santa Rosa, que também tinha um histórico de investir na APS, com um MFC que estava na gestão desse município, na época), e o maior desafio era encontrar condições de trabalho. Embora tivéssemos uma MFC na coordenação da SF na época, a compreensão da abrangência do que podíamos fazer na APS era restrita, desde a gerencia local, em não fornecer material para procedimentos, como sutura, por exemplo, até o arquiteto, para fazer reforma na unidade, com frases como “isso é um PSF”, não faz essas coisas….Além, é claro, da fragilidade da forma de contratação, que deixava, na época, os profissionais à mercê do proselitismo “participativo”, qdo presidentes de associação de bairro assumiram o papel do estado, “contratando” trabalhadores.
Claunara: Minha inserção na gestão foi a partir da coordenação da unidade que entrei como medica em 1996, dois anos depois (1998) fiz um concurso para o município de Porto Alegre e fui convidada – por aquela MFC que havia implantada a SF em Poa (Maria da Gloria Accioly Sirena) a assumir a coordenação do então Programa de Saúde da Família. Minha tarefa era substituir a relação contratual das associações de moradores, para, na época um convênio com a FAURGS (fundação de apoio à UFRGS), com uma taxa administrativa de 5% (fico pensando hj como fiz essa negociação!! Eu tinha 33 anos) e como contraparte as unidades de SF serviriam de estágio para alunos da UFRGS (estamos falando de uma época em que os curriculuns das áreas da saúde não continham cenários na APS). Todos os profissionais, que já haviam passado por processo seletivo, foram admitidos pela fundação. Isso durou até uma mudança na gestão municipal e foi substituída por uma OS, que até hoje responde por problemas nas prestações de conta, etc. Como Porto Alegre vive HOJE, uma situação dramática de demissão de mais de 500 trabalhadores da APS, em plena pandemia, pela extinção do IMESF, considerado inconstitucional pelo STF, e nenhum será mantido na nova forma de contratação prevista. É uma dor muito grande viver isso nesse momento. Importante relatar, que o Conselho Municipal de Saúde na época foi contrario a essa forma de contratação dos trabalhadores, e somente aprovou o PSF, com uma avaliação , um ano após, de sua qualidade, para mante-lo. Claro, que com um ano já tínhamos resultados no acesso, nas imunizações, nos pre-natais, nos tratamentos de condições crônicas, tanto que nossa experiencia ficou entre 10 na Primeira Mostra de SF. E isso graças aos trabalhadores que fizeram parte dessa construção naquele momento.
Claunara: Dessa experiencia na coordenação da SF em Porto Alegre, e por ter tido uma colega na residência , Cristiana Aranha, que trabalhou como MFC na gestão municipal de um município mineiro, cujo secretario era Luis Fernando Rolim Sampaio, que trabalhava no MS, na então Secretaria de Políticas, fui convidada para o MS. Em 2000 eu havia entrado no processo seletivo do SSC/GHC, então solicitei licença para tratamento de interesse, no GHC e na SMS, e em 2001 fui para Brasilia. Fui a primeira MFC no MS. O que fiz, em cada espaço de assessoria e de direção que passei, foi levar a discussão do significado de ter um SUS orientado pela APS, uma busca incessante de evidências, com pesquisas, com relações internacionais, com representação dos Estados e Municípios, de que, no dizer de Habicht e Victora, não precisávamos demonstrar o impacto de uma politica que já tem evidencias de sua efetividade, precisávamos demonstrar se ela estava chegando a quem dela mais precisava.
Assim foi minha relação com a pesquisa, com a busca de evidencias, com buscar respostas nos serviços e com elas “negociar”, Em todos os espaços de gestão que ocupei, da gerencia de uma UBS (PSF Esmeralda, de 1996 a 1998), da Coordenação do PSF , de 2008 a 2001, da direção do DAB, de 2008 a 2010, da gerencia do SSC/GHC, de 2011 a 2013, e atualmente, na chefia da UBS Santa Cecilia, do HCPA, sempre enfrentei a contra hegemonia do que realmente deveria ser a prioridade – traduzida pelos investimentos – no SUS. E sempre tive convicção , que onde ocupei esses “cargos” eu teria que ser andragógica, ou seja, explicar o que é um sistema de saúde, cujas “pessoas” estejam no centro, aquilo que aprendi e sou, como MFC.