Em 2017, a Organização Mundial da Saúde adota o mote “saúde mental no ambiente de trabalho” para a data, com abordagem na ansiedade e depressão. A pressão no ambiente de trabalho, particularmente em uma crise em que há um alto desemprego e instabilidade, faz com as pessoas tentem suportar ao máximo, situações desgastantes e muitas vezes degradantes, isto gera muita ansiedade e às vezes pode acabar em episódios de despersonalização, também chamado de burnout. Mas também podem ocorrer quadros de neuroses e mistos de ansiedade/depressão. Todos provocam muito sofrimento e levam as pessoas frequentemente a terem problemas, tanto no trabalho, como na vida familiar e mesmo na saúde física.
“Quando olhamos para o DSM (diagnóstico em saúde mental – a bíblia dos psiquiatras) vemos que estes diagnósticos são feitos aplicando questionários estruturados, que conforme a pontuação, indicam este ou aquele diagnóstico. Num mundo extremamente populoso, o ambiente de trabalho acaba sendo um foco de tensão. A necessidade de ter o sustento e dificuldade em se manter em um trabalho são presentes, fazendo com que o fenômeno aconteça em praticamente todos os países”, explica Hamilton Wagner, médico de família e comunidade, membro do Grupo de Trabalho de Prevenção Quaternária da SBMFC.
A ansiedade é caracterizada por uma sensação de mal estar, preocupação excessiva com algo, medo de situações do cotidiano, dificuldades para dormir e pesadelos. É fundamental a compreensão do contexto em situações de um quadro de ansiedade e auxiliar as pessoas a encontrarem respostas aos medos e preocupações. O erro mais comum é medicalizar estas pessoas como se um calmante fosse diminuir a situação de ansiedade, apenas leva as pessoas a não reagirem e frequentemente as tornam dependentes deste tipo de medicação.
Já o diagnóstico de depressão é baseado na falta de satisfação com a vida, no desinteresse por suas atividades rotineiras e o desejo de morrer. Algumas pessoas neste quadro podem ser agressivas como forma de lidar com as suas dificuldades. “Uma questão importante é reconhecer se o problema tem um desencadeante que pode ser melhor enfrentado com terapia, por exemplo a perda de um emprego, de um amor, de um ente querido. Mas algumas pessoas não tem este desencadeante e sofrem muito por não se acharem adequadas a fazer parte do mundo. Além da terapia, é necessário um suporte medicamentoso. Felizmente, os quadros depressivos tendem para a remissão espontânea entre nove meses e um ano, mas é comum a recorrência. A abordagem medicamentosa não deve prescindir do suporte terapêutico – seja individual, seja em grupo”, ressalta Wagner.
Sobre como as empresas e colegas de trabalho, além da família, podem contribuir e minimizar os sintomas, o médico de família alerta que é preciso reconhecer os fatores desencadeantes e as situações de sofrimento que as pessoas vivem, seja no ambiente de trabalho, seja em famílias. Melhorar o ambiente corporativo, com respeito aos colaboradores e ter metas realistas e possíveis, é fundamental para prevenir este tipo de situação num ambiente de trabalho.
Já nas famílias é preciso reconhecer e respeitar o sofrimento das pessoas, não minimizando ou desqualificando este sofrimento. Estimular o diálogo, a compreensão entre os membros da família produz resultados muito satisfatórios.
O médico de família e comunidade é central para oferecer um atendimento adequado às pessoas que estão sofrendo. Para isto é necessário que se esteja aberto e atento para perceber os sinais de sofrimento, escutar atentamente e buscar soluções tanto no ambiente de trabalho, como na vida familiar e comunitária. Quando identificado este tipo de quadro, cabe ao médico de família oferecer suporte psíquico e se necessário suporte medicamentoso – este pelo menor tempo possível, e sem nunca deixar de ofertar suporte às situações de vida da pessoa.
Há muitas publicações e muita propaganda sobre estas doenças, principalmente por que há forte interesse econômico no tratamento. O uso descuidado de medicações para ansiedade e depressão leva a maioria das pessoas à dependência de medicamentos, o que é muito lucrativo para a indústria farmacêutica. “Em um de seus livros (Deadly Psychiatry and Organized Denial), Peter Gøtzshe explora muito a falta de segurança destes medicamentos e a necessidade de se cuidar das pessoas, e não das prescrições. Mas a área é árdua e exige um grande esforço das equipes de saúde para atender a estas pessoas”, finaliza.