Diante da publicação do documento “ORIENTAÇÕES DO MINISTÉRIO DA SAÚDE PARA TRATAMENTO MEDICAMENTOSO PRECOCE DE PACIENTES COM DIAGNÓSTICO DA COVID-19” a Associação Catarinense de Medicina de Família e Comunidade (ACMFC) apresenta aqui algumas considerações:
O conteúdo do documento em questão, que amplia a possibilidade do uso de cloroquina, azitromicina e/ou hidroxicloroquina para casos leves da Covid-19, não passou por análise da CONITEC (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias) e o uso dessas medicações não apresentou alteração do registro por parte da ANVISA, procedimentos importantes para análise e incorporação segura de novas tecnologias pelo Sistema Único de Saúde.
Mesmo com a necessidade de agilizar fluxos frente a gravidade do cenário gerado pela pandemia, os estudos utilizados como base para essa decisão não justificam a condução dessa forma, seja pela fragilidade das evidências com relação a benefícios dessas incorporações, seja pelo risco de efeitos adversos potencialmente graves e fatais pelo uso dessas medicações.
Até o momento, as evidências apontam que o uso de hidroxicloroquina (derivado farmacológico da cloroquina) para prevenção de complicações ou tratamento da Covid-19: não reduziu taxa de mortalidade, não reduziu necessidade de intubação dos pacientes, não reduziu tempo de internação, e para casos leves e moderados não alterou a eliminação do vírus, além de eventos adversos maiores nos pacientes que utilizaram essa medicação, comparados aos que não utilizaram.
Entidades como a Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, Associação de Medicina Intensiva Brasileira, Sociedade Brasileira de Infectologia, Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia e Sociedade Brasileira de Imunologia apresentam como sugestão a não utilização da combinação de hidroxicloroquina ou cloroquina e azitromicina de rotina no tratamento da Covid-19.
Reforçamos a importância do processo compartilhado de decisões para o cuidado dos pacientes com Covid-19, porém vale ressaltar que nesse cenário extremo de medo e preocupações, e de compartilhamento de notícias falsas e informações incorretas, a mediação por parte dos profissionais de saúde é indispensável para essa decisão.
Outra preocupação é que médicos da atenção primária em nosso estado, onde devem chegar preferencialmente os casos leves, não estão habituados a prescrever e manejar o uso de cloroquina e hidroxicloroquina.
Além disso, diante da polarização e uso político intenso da medicina, existe um grave risco de pressão e violência contra profissionais de saúde para realizar procedimentos que vão contra a boa prática médica. Nesse sentido, reforçamos a importância da autonomia e liberdade profissional respaldadas pelo código de ética médica e pela legislação brasileira.