Isabel Correia – Diretora de Residência Médica Pós-Graduação Lato Sensu da SBMFC*
Bárbara Barreiros – Diretora do Departamento de Residência da SBMFC*
Como é a residência em Medicina de Família e Comunidade?
A residência médica é consagrada como a melhor forma de preparo para a inserção dos médicos na vida profissional. É considerada o padrão ouro na formação de especialistas, sendo uma modalidade de ensino associada ao trabalho em saúde. Na maioria dos países é pré-requisito para atuação na especialidade. A residência em Medicina de Família e Comunidade no Brasil destina-se então à formação do médico de família e comunidade. Os programas de residência em MFC devem oportunizar que o novo profissional adquira e aprimore competências, ou seja, conhecimentos, habilidades e atitudes, para que atuem com excelência na especialidade. No Brasil, a Residência em Medicina de Família e Comunidade tem duração de 2 anos. Ao todo são 268 programas cadastrados no MEC, totalizando a oferta de 2979 vagas de R1.
Quais são as atribuições da R1? Quais são as atribuições da R2?
Não existe diferenciação entre atribuições do residente do primeiro ano (R1) e do residente do segundo ano (R2) no que diz respeito aos tipos de atividades desenvolvidas no programa. A aquisição de competências deve ser acumulada ao longo dos 24 meses de treinamento em serviço. Cada programa de residência tem no seu Projeto Político Pedagógico uma grade de atividades para o primeiro e segundo anos de residência que irão permitir ao residente trabalhar as competências clínicas e não clínicas. O grau de autonomia para o manejo das situações nos diversos cenários de prática dos programas é que varia no primeiro e segundo ano de acordo com a aquisição das competências. Espera-se que o residente, com o passar dos meses, vá adquirindo competências (conhecimentos, habilidades e atitudes) e tornando-se mais autônomo como especialista da área.
Com este fim, e alinhado à compreensão da necessidade de que os programas de residência tenham seus currículos desenhados com base na definição de competências, a SBMFC desenvolveu o Currículo Baseado em Competências, que define uma gama de competências a serem adquiridas para o MFC estabelecendo níveis como pré-requisito, essenciais, desejáveis e avançadas. Tal documento pode ser utilizado pelos PRM para acompanhar o desenvolvimento de cada residente ao longo dos dois anos do programa.
Sobre R3 e R4, são obrigatórias?
Não existe R4 em MFC no Brasil, somente R3. Ele não é obrigatório, mas sim uma complementação da formação do médico de família, na modalidade ensino em serviço, com ênfase para alguma das áreas de atuação da especialidade: gestão, ensino, etc.
Os serviços que atualmente dispõe de R3 são: Unifesp, UERJ e SMS de Florianópolis.
Alem do R3 opcional em MFC, a residência em MFC também pode ser um pre requisito pra ingressar em outras residencias que sao areas de atuação compartilhada com outras especialidades. Hoje são areas de atuação que aceitam a residência em MFC como pré requisito a Administração em Saude, Hansenologia e Medicina Paliativa.
As residências em outros países são válidas no Brasil?
Assim como a graduação feita em outro país devem ser validadas no país, as pós graduações latu sensu devem ser revalidadas segundo resolução da CNRM n 08 de 07 de julho de 2005, a ser feita por instituições públicas que possuam programas de resindencia de mesma especialidade(credenciados pela CNRM) e registrados pela Comissão Nacional de Residência Médica, a depender do conteúdo do currículo e carga horária e , se necessária, avaliada por comissão de médicos especialistas da mesma área.
Como avaliar a qualidade de uma residência?
Existem vários critérios que são considerados essenciais para se avaliar a qualidade de um programa de residência. Primeiramente é preciso ter competências traçadas e bem definidas para serem aprimoradas e ou adquiridas ao longo dos 2 anos do programa. Existem alguns documentos que devem nortear a organização de um Projeto Político Pedagógico de uma residência em Medicina de Família e Comunidade. No Brasil algumas resoluções dissertam sobre essa estruturação: as resoluções da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), a Resolução número 1 de 25 Maio de 2015 CNRM/MEC, e o Currículo Baseado em Competências da SBMFC. Esses documentos norteiam os programas na sua estruturação e incluem carga horária a ser realizada em atividades na Unidade de Saúde da Família e em outros cenários de práticas, tais quais ambulatórios de outras especialidades, estágios hospitalares e composição de atividades teóricas e práticas.
Uma vez definidas as competências e os objetivos de aprendizagem para cada cenário de prática é preciso um sistema de avaliação robusto que mensure o alcance dos objetivos de aprendizagem e competências traçados pelo programa. Esses sistema de avaliação deve levar em conta uma avaliação formativa e somativa, ou seja, com feedback contínuo que permita ao residente trabalhar as suas necessidades percebidas e não percebidas de aprendizagem e com isso seguir seu percurso formativo. Soma-se a isso a concepção pedagógica que deve estruturar um programa de residência que se baseia no pressuposto da andragogia e ensinagem centrada no residente. Para facilitar a aquisição e o aprimoramento de competência a presença de preceptoria presencial e integral é imprescindível.
Quais as características que um aluno deve levar em consideração ao escolher um programa de residência?
As características de cada programa devem ser avaliadas pelos candidatos, cada programa tem sua especificidade, fortalezas, fragilidades e dependendo do que o futuro residente espera de um programa ou pensa para sua formação, deve escolher o programa que mais atende à suas demandas.
Características como residências de serviços acadêmicos (universidades), hospitalares e de serviços em redes municipais devem ser levados em conta pelo residente, pois elas caracterizam o funcionamento da parte assistencial do PRM e podem fazer diferença de acordo com o que cada futuro MFC espera para si.
Como se preparar para a residência?
No Brasil não há uma prova nacional única para ingresso num programa de residência, logo, é preciso que o candidato a uma vaga no programa de residência em MFC esteja atento aos Editais de Residências. Estes contém informações sobre a seleção, características da prova, e opções de serviços que ofertam vagas na especialidade.
No mais, o bom médico de família é antes de tudo um bom médico, por isso a melhor forma de se preparar para a residência é sendo diligente com sua própria formação na área da medicina.
Sobre a preceptoria, quais são os atributos de um profissional que irá orientar os residentes durante os dois anos?
Esse preceptor precisa ter realizado residência em Medicina de Família e Comunidade ou ter o título de especialista em MFC com experiência em atuação na Atenção Primária à Saúde.
O preceptor deve atuar como facilitador do processo de aprendizagem do residente, identificando com base no Projeto Político Pedagógico do programa quais as lacunas de aprendizagem do residente, sempre considerando o este como o principal responsável pelo seu percurso formativo, atuando como facilitador do processo de aprendizagem.
Não existe para nenhuma especialidade no país a exigência de formação pedagógica para atuar como preceptor de residência. Nos últimos anos várias ofertas de cursos de formação (para preceptoria de residência em geral e também específico para a MFC) têm sido disponibilizadas pelo país. Isto está alinhado à compreensão de que para atuar como preceptor não basta ser um expert na especialidade. É preciso a aquisição e aprimoramento de competências pedagógicas para a prática da preceptoria. É fato que tais formações preparam melhor o preceptor para receber o residente, qualificando seu trabalho de facilitar o processo de aprendizagem do residente.
O Trabalho de Conclusão de Curso é opcional para a conclusão da Residência?
O TCC pode ou não ser um pré-requisito para a conclusão e certificação do residente em Medicina de Família e Comunidade. Cada programa de residência em MFC está vinculado a uma Comissão de Residência Médica (COREME) que em regimento próprio define os critérios para esta certificação, inclusive sobre a obrigatoriedade do TCC.
Desejam acrescentar alguma informação adicional?
A residência médica tem ainda um papel que vai além da especialização do profissional, pois esses profissionais de saúde serão necessários para se estabelecer um sistema de saúde. Logo, a residência médica tem um papel fundamental na definição do desenho, o modelo de atenção, estabelecido no sistema de saúde. É através da regulação da oferta de vagas de residência médica, entre as diferentes especialidades, que se é capaz de garantir que não exista carência ou excessos de especialistas para atuarem em diferentes áreas do sistema de saúde. Assim, se temos como objetivo ter um sistema de saúde com uma APS forte e com papel central no modelo de atenção, é importante que pelo menos 40% das vagas de residência médica no país sejam destinadas à Medicina de Família e Comunidade. A distribuição das demais vagas também deve atender às necessidades do sistema de saúde.