A adoção de critérios rigorosos e transparentes para validação de diplomas de Medicina obtidos em países estrangeiros, a formulação de políticas públicas que favoreçam a fixação de médicos em zonas de difícil provimento, o aumento de investimentos na assistência em saúde, o combate à violência contra os profissionais da saúde e a definição de medidas de acesso equânime à assistência farmacêutica. Estes são alguns dos pontos da Declaração de Florianópolis, documento aprovado por representantes de 17 países da América Latina, Caribe e Península Ibérica, que durante os dias 28 a 30 de março, participaram do V Fórum Ibero-americano de Entidades Médicas (Fiem), realizado em Florianópolis (SC).
O documento será encaminhado formalmente ao Governo brasileiro pelas entidades médicas brasileiras. “É importante que os gestores saibam que nossas preocupações são compartilhadas e apoiadas pela comunidade médica internacional. Acreditamos que, por meio do diálogo, poderemos encontrar as soluções aguardadas pelos médicos e pela sociedade”, afirmou o presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Roberto Luiz d’Avila, anfitrião das delegações. Para ele, a Declaração de Florianópolis reforça a preocupação da classe médica com o futuro da Medicina, a qualidade da assistência em saúde e a vida dos cidadãos nos países signatários.
Ao aprovar a Declaração, após três dias de debates, as entidades médicas das 17 nações participantes do Fiem entenderam ser fundamental o seu posicionamento conjunto ante aos desafios do setor, que afetam milhões de pessoas. Entre os problemas citados constam: a falta crônica de financiamento à saúde, os abusos éticos cometidos por tomadores de decisão e a ausência de políticas públicas em nível governamental. As entidades também exigiram dos diferentes Governos o apoio a medidas que integram o documento aprovado como forma de garantir às comunidades atenção em saúde segundo critérios de qualidade técnica, eficácia de resultados e segurança plena aos pacientes.
Subsídios para o debate – Durante o V Fiem, expositores de diferentes nações apresentaram dados que mostraram as problemáticas nacionais acerca dos temas constantes da programação do Fórum. Os subsídios estimularam os debates – em plenários e em grupos de discussão – em busca de diagnósticos e respostas para as dificuldades. São as conclusões deste trabalho que integram a Declaração de Florianópolis. Para os participantes, as questões polêmicas não podem ser ignoradas pelos profissionais, pela sociedade e, principalmente, pelos gestores das distintas esferas.
Segundo o presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), Florentino de Araújo Cardoso Filho, “é de grande relevância que o Brasil e os demais países irmãos no FIEM discutam a capacitação dos médicos na região, tanto na graduação quanto na pós-graduação; assim como analisem, juntos, a situação do mercado de trabalho e suas perspectivas. Deste modo, poderemos vislumbrar um futuro cada vez melhor para os médicos e a saúde da população”.
Esta também é a percepção do presidente da Federação Nacional dos Médicos (Fenam), Cid Célio Jayme Carvalhaes, para quem o encontro em Florianópolis ajudou a entender também os dilemas que afetam o trabalho médico. “Com a crise da Espanha e em Portugal, com as dificuldades das Américas, temos dificuldade muito grande em termos de condições de trabalho, que é, em geral, precarizado”. Ele relata ainda que “na maioria dos países nos temos dificuldades materiais importantes de instalações, insumos e medicamentos, respeitadas as peculiaridades de cada um dos países”.
VALIDAÇÃO DE DIPLOMAS ESTRANGEIROS:
– As entidades médicas devem integrar as comissões de reconhecimento de diplomas, cujo processo deve acontecer em ambiente que garanta sua publicidade e transparência.
– O reconhecimento e a validação dos diplomas estrangeiros devem ocorrer somente após analise curricular e documental e realização de exames (teóricos, práticos, cognitivos, deontológicos e linguísticos) pelos candidatos, em marcos similares aos previstos pelos projetos Revalida (Brasil), Mir (Espanha) e Eunacom (Chile), considerados referências pelo rigor na seleção dos candidatos.
MIGRAÇÃO MÉDICA
– O monitoramento dos fluxos de migração médica, com controle de entrada e saída de profissionais entre os países, deve ser implementada, possibilitando o exercício da Medicina apenas aos candidatos que, mesmo após validação de seus títulos, estejam inscritos nas entidades médicas reguladoras dos países.
– A organização de um registro único de médicos com a contribuição dos países que compõem o Fiem (com dados pessoais, titulação, histórico ético-profissional, formação) deve ser operacionalizada.
TRABALHO E EDUCAÇÃO MÉDICOS
– As entidades médicas devem participar dos processos de regulação do trabalho médico, cabendo-lhes colaborar com a formulação de diagnósticos das necessidades a partir da análise de dados gerais e específicos da população médica, incluindo a oferta de vagas e de cursos de medicina, entre outros.
– Políticas públicas voltadas ao fortalecimento e à valorização do trabalho médico devem ser adotadas pelos governos nacionais para assegurar aos profissionais condições que permitam exercer plenamente a Medicina com autonomia, sem interferência de pressões econômicas e políticas e comprometido com o paciente.
– A oferta de acesso aos profissionais à educação médica continuada, à remuneração adequada, às condições de trabalho e de aposentadoria que tornem possível a prática da Medicina mesmo em áreas de difícil provimento deve ser implementada pelos países. A definição de uma carreira funcional específica dentro do Estado para os médicos aparece como única saída para a cobertura dos chamados vazios assistenciais, permitindo a fixação dos médicos em todas as regiões, estendendo às comunidades os benefícios de uma assistência de qualidade.
VIOLENCIA CONTRA OS PROFISSIONAIS
– A violência contra os médicos é um problema generalizado e em crescimento que afeta especialmente a determinados serviços, como os de emergência, e aos médicos mais jovens. Considera-se imprescindível prevenir e controlar estas situações com o apoio governamental e policial.
ACESSO A MEDICAMENTOS
– A política de medicamentos deve ser uma prioridade de nossos governos, sem que esteja submetida a interesses privados ou de mercado, assegurando ao pacientes tanto seu uso racional como o acesso aos insumos essenciais.
– As entidades médicas consideram imprescindível a exigência de novas políticas internacionais pelas quais os países ricos garantam ao resto da população mundial o acesso e a distribuição de medicamentos essenciais em condições suportáveis para suas economias.
– Os interesses de mercado que condicionam definitivamente a investigação biomecânica e o comportamento da indústria farmacêutica e de tecnologias em saúde devem estar submetidos aos interesses da saúde e à sustentabilidade e à manutenção dos sistemas nacionais de saúde universais, equânimes e solidários em todos os nossos países.
– As entidades médicas devem intervir efetivamente e prestar contas em grupos de trabalho ou estruturas públicas, que permitam a tomada de decisões sobre avaliação, habilitação, registro, financiamento e monitoramento do uso de medicamentos e de novas tecnologias em saúde.
– Os médicos devem estar dispostos a declarar seus conflitos de interesse quando intervenham ou participem em estudos de investigação, realizem publicações, formação ou informações relacionados a quaisquer aspectos que afetem o exercício da profissão médica. Nossas organizações médicas devem estar dispostas a introduzir e exigir uma nova cultura de comportamento médico que incorpore a declaração de conflitos de interesse em suas referências curriculares.
Fonte: CFM