Texto número 8 da série sobre 16 dias de ativismo contra a violência relacionada ao gênero, organizada pelo Grupo de Trabalho Mulheres na MFC, com apoio de outros GTs.
“Máscara, gorro, faceshield, avental, luvas… ‘Valentina!!’ Seria mais uma criança com sintomas de resfriado na pandemia, se a sua mãe não tivesse aproveitado para perguntar: ‘Dra., me passa um remédio pra eu parar de beber?’. Perguntei porque. E o que se seguiu foi um relato de brigas, discussões e arranhões que vinham depois do uso da bebida. À tarde, já no atendimento à agenda, uma gestante entra cabisbaixa para o pré-natal. ‘Como está sendo esse processo da gestação?’, pergunto. Após falar sobre a gravidez não planejada, a gestante relata brigas e discussões. ‘E já aconteceu de um agredir o outro?’ ‘Já. Na última vez, eu empurrei ele e ele me chutou. Eu já estava grávida…'”
Na definição de violência intrafamiliar, destacamos que ela pode ser dentro e fora de casa e pode ser cometida por qualquer pessoa da família, incluindo quem exerce uma função parental e/ou uma relação de poder em relação à outra. As principais atingidas são as mulheres, as crianças e as idosas, além das portadoras de deficiência (1). Podem ocorrer violências entre pais/mães e filhas, entre netas e avós, ou qualquer pessoa da família que conviva. A violência pode ser física, psicológica, moral, patrimonial, sexual. Dentro da violência sexual está desde o assédio mais velado, passando pelo estupro marital e até o abuso sexual de crianças e adolescentes que já mencionamos aqui. A violência mais comum dentro da família é a violência íntima, aquela que ocorre entre casais. No mundo, pelo menos um terço das mulheres já sofreu violência física ou sexual do parceiro ou da parceira íntima ao longo da vida (2). Assim, as Equipes de Atenção Primária à Saúde devem estar atentas para identificar e manejar as situações de violência, pois ela é um problema de saúde pública muito prevalente, com consequências nefastas para a vida de todas as pessoas envolvidas. É preciso ter atenção a sinais indiretos, como queixas de dor crônica, sintomas geniturinários e questões de saúde mental. A violência intrafamiliar deve ser tratada como uma condição crônica e sua notificação, como de outras violências, é compulsória!
Muitas mulheres não nomeiam a violência, por isso, muitas vezes pode ser necessário perguntar sobre o relacionamento de formas criativas. Existem vários materiais de apoio para colaborar nisso (3). Nesse link, há um questionário que pode lhe ajudar a fazer perguntas-chave: https://bit.ly/3eqKQ1p (tradução livre do site: https://www.loveisrespect.org/quizzes/). O período do pré-natal e as consultas de puericultura podem ser oportunidades para perguntar: “como vão as coisas em casa?”.
A escuta atenta é a primeira chave para o acompanhamento adequado. Mapear o risco, conhecer a rede de apoio são elementos fundamentais (4). Na Medicina de Família e Comunidade, a abordagem familiar deve estar pulsando! Conheça também a rede de atendimento à mulher do seu município. E não esqueça de marcar retornos frequentes no casos em suspeita ou acompanhamento. Nada será resolvido com pressa.
Nos próximos textos, você conhecerá mais sobre a Lei Maria da Penha, sobre a Violência Patrimonial e sobre o Estupro Marital.
Por Evelin Gomes Esperandio – http://lattes.cnpq.br/0443544527839084
Referências: