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O atendimento de pessoas trans na Atenção Primária à Saúde

31 de janeiro de 2020

29 de janeiro foi celebrado o Dia da Visibilidade Trans: um momento de olhar para as inequidades e violências sofridas por esta população. Com o comprometimento de que essa realidade seja transformada, o GT de Gênero, Sexualidade, Diversidade e Direitos da SBMFC abriu espaço em suas redes sociais para que Médicas e Médicos de Família e Comunidade falassem de suas dificuldades no atendimento de pessoas trans. O texto a seguir discute os temas abordados em resposta à postagem nas redes sociais. As perguntas foram respondidas pela médica de família e comunidade, membro do GT, Ana Paula Andreotti Amorim. 

O termo “trans” utilizado neste texto é uma abreviação, comumente utilizada e frequentemente aceita tanto na literatura quanto pelo movimento social,  para referir-se à população formada por pessoas que identificam-se politicamente, no Brasil, como travestis, mulheres transexuais, homens trans e pessoas transmasculinas, pessoas não binárias e demais pessoas com diversidades de gênero (1) (2) (3). Uma pessoa trans é aquela que não identifica-se com o gênero que foi atribuído a ela ao nascimento, enquanto uma pessoa cisgênera (ou “cis”) é aquela que sente-se confortável com o gênero atribuído a ela ao nascer (1) (4). Ter qualquer identidade trans não é sinônimo de odiar seu corpo ou sua genitália, não significa querer usar um determinado tipo de roupa ou ter um certo jeito de ser, não relaciona-se a ter mais ou menos desejo sexual e não pode ser confundido em querer se relacionar com pessoas de um gênero ou outro – todos estes aspectos fazem parte das diversidades humanas e não podem ser utilizados como critérios para reconhecer ou oferecer cuidados às pessoas trans. Só saberemos se uma pessoa identifica-se como cis ou trans se perguntarmos e se ela sentir-se confortável para nos dizer. Da mesma forma, dentre as diversas possibilidades de existências trans e identidades políticas, cabe perguntar sobre a denominação com a qual a pessoa sente-se mais confortável.

Pesquisas realizadas em diversas populações do mundo buscando dados estatísticos encontraram entre 0,5 e 1,3 % de pessoas trans (5). No Brasil, o resultado preliminar de um estudo realizado em 2018 (6) demonstrou aproximadamente 1,38% de pessoas trans. Apesar destes dados, que possuem questionamentos quanto à sua abrangência e parecem subestimar quantitativamente esta população, ainda não foi realizado um censo das pessoas trans no Brasil, mas sabemos que elas são muitas e estão em todos os lugares, por isso todos os serviços de saúde devem considerar suas necessidades.

Infelizmente, a maioria dos cursos de graduação e de ensino técnico ainda não inclui em seu currículo as especificidades de cuidado de pessoas trans. Portanto, além de ampliar a formação dentro dos cursos formais, é necessário oferecer treinamento para profissionais que já se encontram em serviço. Alguns cursos on-line sobre Saúde da População LGBTI são esporadicamente disponibilizados gratuitamente (7) e podem ser utilizados com o objetivo de colocar profissionais em contato com o assunto, mas a necessidade de formação precisa ser considerada entre os temas de Educação Continuada oferecidos a trabalhadoras(es) da saúde, dentro de momentos programados e com garantia de tempo suficiente para que os conceitos e as necessidades de saúde de pessoas trans possam ser abordados e trabalhados. Uma estratégia muito utilizada e que demonstra grande capacidade de sensibilização de profissionais é ter a presença de pessoas trans experientes em formações profissionais, de forma a aproximar trabalhadoras(es) da saúde da realidade desta população.

O acolhimento inicial das pessoas no serviço é determinante e deve ser foco das capacitações. As situações de transfobia vivenciadas nos diversos setores de serviços de saúde, inclusive na recepção das UBS, são violências banalizadas por profissionais, que não atentam para direitos e necessidades das pessoas trans (2). É necessário estruturar possibilidades de cuidado e intervenção caso a pessoa seja constrangida direta ou indiretamente por demais usuárias(os) de saúde ou mesmo por profissionais, garantir que o nome social seja oferecido a todas as pessoas (cis ou trans) no momento do cadastro (8) e imprimir o CNS com o nome social (9) quando este for referido, utilizar o nome social no prontuário e em todos os impressos utilizados pelo serviço (10), perguntar ativamente sobre o gênero autorreferido de cada pessoa (assim como deve-se perguntar sobre a cor de pele) independentemente ao “sexo” descrito em documentos ou no cadastro do CNS, garantir uso de pronomes adequados de acordo com o gênero autorreferido (Sra., Sr., ela, ele, etc.) e ofertar cuidados relacionados à necessidade real e subjetiva da pessoa atendida ao invés de pautados na percepção estigmatizadora ou simplesmente por curiosidade de quem atende. Todas as pessoas trabalhadoras do serviço de saúde precisam ser responsáveis por esses cuidados e por apontar falhas nos fluxos estabelecidos, para que sejam trabalhadas coletivamente. A ambiência também pode comunicar abertura e dedicação da unidade para lidar com as especificidades e para não excluir, portanto posicionar placas ao lado dos sanitários que divulguem o direito de cada pessoa usar o banheiro de acordo com o gênero com o qual se identifica (11) (12), assim como expor cartaz sobre o direito ao nome social (13) e bandeiras LGBTI ou trans no mural da unidade tem a potencialidade de acolher. O acolhimento extra-muros toma uma proporção importante no processo de cadastramento e oferta de cuidados do serviço, portanto atentar para a capacitação de ACS e dialogar sobre as vulnerabilidades LGBTI no território é importante para que haja tranquilidade no contato com pessoas trans e, consequentemente, seu cadastro no serviço e atenção às suas necessidades e demandas em saúde.

A Política Nacional de Saúde Integral LGBT (14) considera que as pessoas LGBTI tenham acesso aos serviços do SUS, com qualidade e resolução de suas demandas e necessidades. Portanto, todas as categorias profissionais da APS têm responsabilidades no cuidado geral e específico de pessoas trans e podem atuar dentro de sua capacidade técnica. Médicas(os),, Enfermeiras(os) e Técnicas(os) de Enfermagem, como membros de uma equipe nuclear de ESF, devem oferecer acesso e atender às demandas trazidas por cada pessoa. Membros da Equipe de NASF, de Odontologia ou de serviços de referência podem ser acessados em caso de necessidade. Cabe ressaltar que profissionais que trabalham exclusivamente com saúde mental podem colaborar com os cuidados oferecidos pela equipe, caso haja necessidade específica.

A identidade trans não é causada por qualquer condição psiquiátrica, mas pessoas trans estão sujeitas a maiores taxas de adoecimentos mentais como resultado de transfobia (5). Estima-se que adolescentes trans são expulsas(os) da casa da família aos 13 anos de idade, em média, e que apenas 0,02% das pessoas trans frequentam universidades (15). O Brasil é o país com o maior número de assassinatos de pessoas trans (16) e em 2019 confirmaram-se 124 assassinatos divulgados, além de uma média de 11 notificações de pessoas trans agredidas por dia. Aproximadamente 80% das pessoas trans assassinadas em 2019 eram negras, praticamente 60% tinham entre 15 e 29 anos de idade, 67% eram profissionais do sexo e 64% foram executadas nas ruas (15).

Este cenário de violência, somado ao desamparo de políticas públicas, à exclusão do mercado de trabalho e a demais sofrimentos relacionados a exclusões cisheteronormativas em todos os campos da sociedade, reverbera em maiores taxas de adoecimentos mentais (transtornos mentais comuns, depressão, ansiedade, ideações e tentativas de suicídio) e maiores adoecimentos em geral (relacionados a tabagismo, abuso de álcool e de substâncias ilícitas, infecção por HIV e outras IST, afastamento dos serviços de saúde, uso de hormônios inadequados, aplicação de silicone industrial, etc.) quando comparados à população cis.

A OMS, na elaboração da CID 11, refletiu evidências científicas de que a “incongruência de gênero” não configura-se como adoecimento e a excluiu do capítulo de Desordens Mentais e Comportamentais (17). Não é possível considerar superioridade ou inferioridade de qualquer identidade de gênero (18), portanto profissionais de saúde não devem questionar sobre as motivações de uma pessoa para identificar-se com alguma identidade trans ou sobre as suas perspectivas em relação a gênero com intenção de validar ou não sua identidade. Da mesma forma como reconhece-se o direito à autodeterminação de gênero para retificação de nome e gênero em documentos civis (19), é necessário respeitar estudos acadêmicos e perspectivas do movimento social pela despatologização das identidades trans de que não é possível realizar diagnóstico de gênero (5) (20), pois trata-se de uma identidade construída a partir de parâmetros sociais, culturais e históricos (21) (22) durante um longo período de vida e que não representa um problema de saúde. Cabe a profissionais de saúde acolher as pessoas que identificam-se como travestis, mulheres transexuais, homens trans, pessoas transmasculinas, pessoas não-binárias ou com outra variabilidade de gênero, afim de identificar sofrimentos pessoais e, principalmente, sociais aos quais estas pessoas estão submetidas, visando oferecer ações diversas para o cuidado individual.

Pessoas trans podem desejar realizar modificações em sua aparência e em seu corpo, tanto para sentirem-se bem com sua imagem quanto para serem reconhecidas socialmente com o gênero com o qual se identificam. Existem muitas possibilidades para que estas transformações corporais sejam alcançadas, algumas transitórias e outras permanentes, que incluem próteses, uso de cintas, posturas, treinamentos musculares e vocais, uso de substâncias tópicas, intervenções tradicionalmente consideradas estéticas, hormonização ou mesmo cirurgias. Embora algumas cirurgias só sejam disponibilizadas por serviços privados, diversos procedimentos cirúrgicos são oferecidos pelo SUS em serviços regionais que estão preparados para realizá-las. Embora inicialmente fossem somente 5 os hospitais que ofereciam estas cirurgias e demais acompanhamentos no Brasil (23), felizmente muitos municípios e estados organizaram-se para ampliar essa rede de referência e hoje não dispomos de um levantamento de todos os serviços do país. Para conhecer a disponibilidade atual no município em que você atua, assim como o protocolo de encaminhamento a ser seguido, é recomendado consultar a SMS ou a SES local.

O Processo Transexualizador do SUS, ampliado em 2013 (23), considera a realização de cirurgias a partir de 21 anos de idade e após 2 anos de acompanhamento com equipe multiprofissinal, porém uma resolução recente do CFM (24) reconhece a possibilidade das cirurgias serem realizadas aos 18 anos de idade após um ano de acompanhamento. Os serviços cirúrgicos que não realizam por esse tempo mínimo o acompanhamento multiprofissional precisam receber relatórios de outros profissionais (os famosos laudos) que descrevam o tempo de seguimento, a presença de comorbidades e tratamentos concretizados, avaliações de saúde mental realizadas e demais informações relevantes para o procedimento cirúrgico pretendido.

O início da hormonização proposta pelo mesmo Processo Transexualizador é descrita a partir dos 18 anos, porém esta idade também pode ser reconsiderada a partir da nova portaria do CFM, que reconhece benefício de seu início aos 16 anos. Antes desta idade, a partir do estágio de Tanner 2 e em serviços especializados, é possível utilizar fármacos para suprimir o eixo hipotálamo-hipófise-gonadal e bloquear a puberdade em crianças que apresentam possibilidade de sofrimento disfórico com as suas transformações puberais (25).

A palavra “hormonização” é preferida ao invés de “terapia hormonal cruzada” pela população trans, por esquivar-se da perspectiva medicalizadora à qual o termo “terapia” é associado. Apesar do Processo Transexualizador inicialmente considerar apenas serviços multiprofissionais especializados para a realização de hormonização, de acordo com protocolos e experiências internacionais e mesmo nacionais ela pode ser realizada na APS, ao considerar que profissionais da UBS possuem rede de apoio local e em serviços secundários ou terciários, com disponibilidade de uma equipe multiprofissional. Justifica-se a necessidade de acompanhamento da hormonização pela APS também pelo acesso mais facilitado ao serviço e rápida resposta após captação de demanda, pela integralidade e longitudinalidade inerentes ao nível assistencial de forma a garantir o seguimento em muitas oportunidades e realizar vigilância em saúde, pela possibilidade de orientação familiar e/ou comunitária com atuação intersetorial e junto aos equipamentos sociais locais, com possibilidade de reconhecer e cuidar de riscos e reduzir danos associados ao uso indevido de hormônios. Em casos clinicamente complexos, o nível de assistência secundário possivelmente precisará ser acessado e portanto é importante haver diálogo entre os níveis assistenciais.

O Ministério da Saúde ainda não possui um protocolo específico para a realização de hormonização no Brasil, embora alguns municípios e alguns serviços tenham desenvolvido protocolos próprios com base em pesquisas e documentos internacionais. Muitos protocolos internacionais foram desenvolvidos para o atendimento de pessoas trans por profissionais da APS. Para rápida consulta, o de São Francisco (26) é facilmente acessível, está suficientemente atualizado em relação a evidências científicas e considera prevenção quaternária. Os Protocolos do Uruguai (27), do Canadá (28), da Argentina (29), e de Nova Iorque (30) também são bastante utilizados para consultas. O documento da WPATH (31) é uma referência mundial para protocolos e organizações de serviços.

Alguns dos hormônios descritos nos protocolos citados não estão disponíveis no Brasil. As formulações mais facilmente acessadas e mais utilizadas no país para hormonização de travestis, mulheres transexuais e pessoas transfemininas são descritas a seguir.

  • Estrógenos:

17β-Estradiol ou Valerato de Estradiol (1 a 6 mg VO ao dia),

Estradiol Hemi-hidratado (doses equivalentes a 1,5 a 3 mg tópicas ao dia),

17β-Estradiol em sachê (doses equivalentes a 0,5 a 2 mg tópicas ao dia),

Enantato de Estradiol (10 mg IM a cada 2 ou 1 semana – disponibilizada somente associada a algestona).

  • Antiandrógenos (necessário considerar reposição com estrógeno para proteção de massa óssea):

Espironolactona (50 a 200 mg VO ao dia – necessário observar e dosar efeitos colaterais),

Ciproterona (25 a 100 mg VO ao dia),

Acetato de Medroxiprogesterona (2,5 a 10 mg VO ao dia),

Algestona Acetofenida (150 mg IM a cada 30 ou 15 dias – somente associada a Enantato de Estradiol, com alguns estudos demonstrando segurança ao seu uso)(32).

As formulações de testosterona disponíveis para homens trans e pessoas transmasculinas devem sempre receitadas em duas vias, com endereço da pessoa atendida, CID e CPF da pessoa prescritora.

  • Testosteronas:

Undecanoato ou Undecilato de testosterona (1000 mg IM a cada 90 dias),

Cipionato de testosterona (200 mg IM a cada 3 ou 2 semanas),

Decanoato + Fempropionato + Propionato + Isocaproato de testosterona (250 mg IM a cada 3 semanas – ainda carece de estudos qualificados)

Gel de Testosterona 1% (doses equivalentes a 2,5 a 10 mg tópicas ao dia).

Objetiva-se sempre utilizar a menor dose possível de hormônios para alcançar as transformações corporais esperadas. Para esse acompanhamento, os profissionais técnicos da equipe podem oferecer exame físico e aferições de medidas da pessoa atendida, dialogando sobre o tempo esperado para que cada transformação ocorra. Caso decida-se acompanhar níveis séricos hormonais com exames complementares, eles podem ser realizados 4 vezes no primeiro ano de tratamento e, após este período, anualmente.

Espera-se que os níveis de estradiol e testosterona (colhidos exatamente entre duas doses IM para o seu valor máximo ou imediatamente antes da próxima dose IM para seu valor mínimo) encontrem-se nos níveis fisiológicos estabelecidos como valor de referência para pessoas cisgêneras (nível de testosterona esperado para homens cis e nível de estradiol esperado para mulheres cis na menopausa). O hemograma é utilizado para verificar aumento excessivo de hematócrito ao uso de testosterona, assim como TGO e TGP podem indicar sobrecarga hepática. A dosagem de prolactina é recomendada para avaliar hiperprolactinemia, cujos sintomas confundem-se com os efeitos esperados da hormonização. Considera-se também dosar LH. O potássio precisa ser acompanhado ao uso de espironolactona. Glicemia, perfil lipídico, sorologias e β-HCG podem ser considerados e oferecidos. Cabe lembrar que todas as pessoas com colo do útero se beneficiam do rastreamento de câncer cervical e portanto o papanicolaou deve ser ofertado.

Como todo procedimento em saúde com potenciais riscos e que pode gerar modificações definitivas de aspecto e funcionalidade do corpo, da fertilidade e da saúde global, é necessário discutir com a pessoa trans os efeitos esperados e registrar seu consentimento em prontuário. É possível, para tanto, oferecer à pessoa um termo de consentimento e discutir as informações contidas nele em consecutivos encontros. Algumas situações contraindicam de maneira absoluta o início da hormonização, como as seguintes situações transitórias: descompensação de um quadro psicótico, impossibilidade de tomar decisões conscientemente, neoplasia conhecida e dependente do hormônio considerado, doença coronariana instável, gestação e amamentação. Descompensações clínicas, riscos de eventos cardiovasculares, coagulopatias, acometimento hepático, insuficiência renal e outras situações podem ser contraindicações relativas que precisam ser individualmente avaliadas e cuidadas, antes que seja estabelecida a decisão pelo início da hormonização, sempre de maneira compartilhada com a pessoa atendida (33).

A gestação e a amamentação são consideradas contraindicações para a hormonização de homens trans e pessoas transmasculinas devido à possibilidade de androgenização fetal e pelo risco de câncer observado em experimentos animais (34). Apesar de muitos homens trans gestarem em uso de testosterona e não gerarem fetos com genitália atípica, não existem estudos que considerem doses de testosterona exógena que seguramente não causariam androgenização, pois seus efeitos em fetos são observados mesmo ao uso de doses insuficientes para as transformações corporais esperadas por pessoas transmasculinas (35). Portanto caso uma pessoa em uso de testosterona engravide, sua suspensão deve ser considerada junto à pessoa e o mais precocemente possível.

Os cuidados de pré-natal habituais devem ser oferecidos ao homem trans ou à pessoa transmasculina gestante, porém cabe diálogo com a pessoa sobre possíveis desconfortos em frequentar um ambiente habitualmente repleto de mulheres, disforias em relação ao seu corpo ou em relação à via de parto proposta, possibilidades de amamentação, preparo do serviço de parto para o atendimento acolhedor desta pessoa e possibilidade de inclusão da rede de apoio pessoal nos cuidados pré-natais e de puerpério.

Cabe ressaltar que, apesar da hormonização potencialmente diminuir a fertilidade, os hormônios utilizados não tem comprovação ou segurança como contraceptivos em qualquer dosagem. Portanto é prudente abordar possibilidade de gestação a partir das práticas sexuais de cada pessoa e considerar métodos contraceptivos da mesma forma que aborda-se possibilidades de manutenção da fertilidade.

Considerando-se o cuidado ampliado das pessoas trans, além dos serviços de saúde outros recursos institucionais podem ser acessados e costumam ser úteis no cuidado integral além da própria rede do SUS. São exemplos: Defensoria Pública e seus núcleos específicos de combate à discriminação, Conselhos de combate à discriminação e promoção de direitos de LGBTI, Secretarias de Direitos Humanos, Centros de Cidadania LGBTI (em São Paulo), programas e políticas de inclusão social (como o Transcidadania em São Paulo), centros de acolhida públicos e privados direcionados a LGBTI,  grupos de apoio (como o Mães pela Diversidade), instituições parceiras (como ONG) e grupos do movimento social organizado (ANTRA/ IBRAT/ FONATRANS, etc). É importante buscar conhecer as legislações nacionais e locais que protegem os direitos das pessoas LGBTI, para realizar promoção à saúde dessas pessoas.

Para finalizar, importante informar que a SBMFC possui um Grupo de Trabalho direcionado a Gênero, Sexualidade, Diversidade e Direitos, composto por membros que estudam e atuam em diversos cenários relacionados ao cuidado de saúde das pessoas trans. O GT reúne-se presencialmente em congressos da SBMFC e há 3 anos promove o Seminário Sexualidade e Diversidade, que neste ano terá o tema “A Saúde como Direito Humano: Lacunas de Conhecimento e Desafíos Políticos (link: https://doity.com.br/sbmfc-seminario-sexualidade-39928-20191031201452), ao qual Médicas(os) de Família e Comunidade de todo o Brasil são convidadas(os) para somar e trocar experiências profissionais e pessoais.

 

Textos de referência:

  1. 1 – Letícia Lanz. Dicionário Transgênero – parte integrante do livro O corpo da Roupa. Editora Transgente, 2016. Disponível em: https://docero.com.br/doc/e5x8e0
  2. 2 – Relatório Final da 3a. Conferência Nacional de Políticas Públicas de Direitos Humanos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. Brasília, 2016
  3. 3 – Ministério da Saúde – Brasil, IBRAT, Rede Trans. Homens trans: vamos falar sobre prevenção de infecções sexualmente transmissíveis? Página 09. Brasília, 2019. Disponível em:  Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2019/homens-trans-vamos-falar-sobre-prevencao-de-infeccoes-sexualmente-transmissiveis-versao
  4. 4 – Jaqueline Gomes de Jesus. Orientações sobre identidade de gênero: conceitos e termos. Brasília, 2012. Disponível em: https://www.sertao.ufg.br/up/16/o/ORIENTA%C3%87%C3%95ES_POPULA%C3%87%C3%83O_TRANS.pdf?1334065989
  5. 5 – Transgender people: health at the margins of society. The Lancet. Series Transgender Health, volume 388, Issue 10042, P390-400. July 23, 2016. Disponível em: https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(16)00683-8/fulltext
  6. 6 – Estudo não publicado, realizado sob financiamento do PROADI SUS pela Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, com resultados divulgados em 2019 durante o I Encontro Nacional dos Centros de Atendimento à População Transexual – São Paulo, 27/04/2019
  7. 7 – Cursos online já disponibilizados: UNA-SUS https://www.unasus.gov.br/noticia/inscri%C3%A7%C3%B5es-abertas-para-4%C2%AA-oferta-do-curso-online-sobre-pol%C3%ADtica-de-sa%C3%BAde-lgbt ; PNEC-DH https://www.escolavirtual.gov.br/curso/128 ; UFRGS https://lumina.ufrgs.br/course/view.php?id=62
  8. 8 – Ministério da Saúde – Brasil. Portaria nº 1.820, de 13 de Agosto de 2009. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2009/prt1820_13_08_2009.html
  9. 9 – Ministério da Saúde – Brasil. Nota Técnica 18/2014. Disponível em: http://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2014/setembro/24/NOTA-TECNICA-NOME-SOCIAL-18-2014.pdf
  10. 10 – Presidência da República – Brasil. Decreto nº 8.727, de 28 de Abril de 2016. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Decreto/D8727.htm
  11. 11 – Ministério dos Direitos Humanos – Brasil. Manual Orientador Sobre Diversidade. Brasil, 2018. Disponível em: https://www.mdh.gov.br/todas-as-noticias/2018/dezembro/ministerio-lanca-manual-orientador-de-diversidade/copy_of_ManualLGBTDIGITAL.pdf
  12. 12 – Ministério da Saúde – Brasil. Atenção Integral à Saúde da População Trans – Conteúdo para Profissionais de Saúde / Trabalhadores dos SUS. Brasília, 2016. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/cartazes/nome_social_sus.pdf
  13. 13 – Cartaz para impressão disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/cartazes/nome_social_sus.pdf
  14. 14 – Ministério da Saúde – Brasil. Portaria nº 2.836, de 1º de Dezembro de 2011. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt2836_01_12_2011.html
  15. 15 – Bruna G. Benevides, Sayonara Naider Bonfim Nogueira. Dossiê dos Assassinatos e da Violência contra Travestis e Transexuais no Brasil.  São Paulo: Expressão Popular, ANTRA, IBTE, 2020. Disponível em: https://antrabrasil.files.wordpress.com/2020/01/dossic3aa-dos-assassinatos-e-da-violc3aancia-contra-pessoas-trans-em-2019.pdf
  16. 16 – Transgender Europe. Trans Murder Monitoring Update. 2016. Disponível em: https://tgeu.org/transgender-day-of-visibility-2016-trans-murder-monitoring-update/
  17. 17 – WHO. ICD 11. http://www.euro.who.int/en/health-topics/health-determinants/gender/gender-definitions/whoeurope-brief-transgender-health-in-the-context-of-icd-11
  18. 18 – Signatária do Brasil: Sonia Onufer Corrêa. Princípios de Yogyakarta. Julho de 2007. Disponível em:, http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/gays/principios_de_yogyakarta.pdf
  19. 19 – Conselho  Nacional de Justiça. Provimento nº 73, de 28 de Junho de 2018. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/direitos_humanos/LGBT/LEGISLACAO/Atos%20Administrativos%20-%20Portal%20CNJ%2073.pdf
  20. 20 – WPATH. WPATH Position on “Rapid-Onset Gender Dysphoria (ROGD)”. 4 setember 2018. Disponível em: https://www.wpath.org/media/cms/Documents/Public%20Policies/2018/9_Sept/WPATH%20Position%20on%20Rapid-Onset%20Gender%20Dysphoria_9-4-2018.pdf
  21. 21 – Joan Wallach Scott. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade. Porto Alegre, vol. 20, nº 2, jul./dez. 1995, pp. 71-99
  22. 22 – Judith Butler. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Tradução: Renato Aguiar. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira. 2003.
  23. 23 – Ministério da Saúde. Portaria nº 2.803, de 19 de novembro de 2013. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt2803_19_11_2013.html
  24. 24 – Conselho Federal de Medicina. Resolução  nº 2.265, de 20 de setembro de 2019. Diário Oficial da União. Edição 6, seção 1, página 96. Publicado em 09/01/2020. Disponível em: http://www.in.gov.br/web/dou/-/resolucao-n-2.265-de-20-de-setembro-de-2019-237203294
  25. 25 – Lucio Flavio Gonzaga Silva. Processo-Consulta CFM nº 32/12 – Parecer CFM nº 8/13. Brasília, 22 de fevereiro de 2013
  26. 26 – Madeline B. Deutsch. Guidelines for the Primary and Gender-Affirming Care of Transgender and Gender Nonbinary People. University of California, San Francisco. June 17, 2016. Disponível em: https://transcare.ucsf.edu/guidelines
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  28. 28 – Amy Bouns. Guidelines and Protocols for Hormone Therapy and Primary Health Care for Trans Clients. Sherbourne Health Centre, Rainbow Health Ontario. First edition, 2009. Disponível em : http://sherbourne.on.ca/wp-content/uploads/2014/02/Guidelines-and-Protocols-for-Comprehensive-Primary-Care-for-Trans-Clients-2015.pdf
  29. 29 – Juan Péchin, Ilona Azel, Erica Mallo, Diego Javier Garcia. Atención de la salud integral de personas trans. Guía para equipos de salud. Programa Nacional de Salud Sexual y Procreación Responsable. Buenos Aires. Junio, 2015. Disponível em: http://formsus.datasus.gov.br/novoimgarq/33110/6108112_353278.pdf
  30. 30 – Callen-Lorde Community Health Center. Protocols for the Provision of Hormone Therapy. 2014. Disponívem em: https://callen-lorde.org/graphics/2018/04/Callen-Lorde-TGNC-Hormone-Therapy-Protocols.pdf
  31. 31 – Eli Coleman, et. al. Normas de atenção à saúde das pessoas trans e com variabilidade de gênero.World Professional Association for Transgender Health. 7ª versão. 2012. Disponível em: https://www.wpath.org/media/cms/Documents/SOC%20v7/SOC%20V7_Portuguese.pdf
  32. 32 – Elsimar M. Coutinho, et. al. Comparison of two regimens of a monthly injectable contraceptive containing dihydroxyprogesterone acetophenide and estradiol enanthate. Contraception – Elsevier. 73 (2006). 249-252
  33. 33 – Moira Stewart, et. al. Medicina Centrada na Pessoa: Transformando o Método Clínico. 3ª edição. Tradução de Anelise Burmeister e Sandra Maria Mallmann da Rosa. Versão impressa: 2017
  34. 34 – Alessandra E. da Silva, Rogeria Serakides, Geovanni D. Cassali. Carcinogenese hormonal e neoplasias hormonio-dependentes. Ciência Rural, Santa Maria, Vol. 34, nº2, p.625-633. Mar-Abr, 2004. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cr/v34n2/a48v34n2.pdf
  35. 35 – Margaret de Castro, Lucila Leico Elias. Causas raras de pseudo-hermafroditismo feminino: quando suspeitar? Arquivos Brasileiros de Endocrinologia & Metabologia. Vol 49, nº 1. Fevereiro de 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/abem/v49n1/a17v49n1.pdf