Santa Catarina atravessa um momento delicado na pandemia causada pelo SARS-CoV-2, vírus causador da COVID-19. Temos acompanhado com preocupação o crescimento expressivo do número de casos e, em especial, o aumento das taxas de ocupação hospitalar e do número de óbitos, especialmente em determinadas regiões, como Foz do Rio Itajaí, Laguna, Xanxerê e Grande Florianópolis. 1
A situação demanda a atenção dos gestores públicos e autoridades de saúde, além de especial atenção nos cuidados individuais por parte da população.
A fragilidade e impotência frente ao avanço do novo vírus gera angústia nos profissionais da linha de frente e também nos pacientes, ansiosos por um tratamento que reduza os riscos de evolução para doença grave e/ou previna a infecção, porém é fundamental que, neste momento, a população e as autoridades políticas locais dêem atenção às recomendações vindas de equipe técnica e fontes confiáveis.
Diversas notícias e protocolos sem evidências científicas robustas vêm sendo divulgados nos últimos dias prometendo cura e prevenção da infecção pelo novo coronavírus. Alertamos que, até o presente momento, não há no Brasil medicação antiviral específica para o tratamento da COVID-19. Muitos medicamentos já utilizados na prática médica estão sendo estudados mas, infelizmente, até agora nenhum se provou eficaz, sendo alguns, inclusive, relacionados a potenciais danos e efeitos adversos, como é o caso da cloroquina e da hidroxicloroquina.3 A Organização Mundial de Saúde, bem como outras entidades internacionais, e a agência nacional reguladora de medicamentos norte-americana (FDA) não recomendam o uso de cloroquina/hidroxicloroquina no tratamento da COVID-19.2,3
Medicações como ivermectina e nitazoxanida, não possuem ação in vivo comprovada contra o SARS-CoV-2 e seu uso deve ser restrito a estudos clínicos que dirão se há ou não benefício no tratamento da COVID-19, bem como devem estabelecer qual a dose adequada. Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) “até o momento, não existem medicamentos aprovados para prevenção ou tratamento da Covid-19 no Brasil”. 4 Suplementos como sais de zinco, vitamina C e vitamina D também não têm benefício comprovado de uso em pacientes sem deficiência vitamínica. A dexametasona, outra medicação amplamente utilizada na medicina para outros fins, mostrou-se eficaz em relatório preliminar de um grande estudo clínico quando utilizada para paciente internados, com necessidade de uso de oxigênio suplementar, e não é indicada até o momento para quadros leves em tratamento domiciliar.5 Trata-se de um corticoide, cujo uso indiscriminado pode levar a conhecidos e temidos eventos adversos, especialmente na vigência de quadro infeccioso agudo. Para mais detalhes sobre estes e outros medicamentos no combate À COVID-19, recomenda-se a leitura do INFORME DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE INFECTOLOGIA SOBRE O NOVO CORONAVÍRUS N° 15: USO DE MEDICAMENTOS PARA COVID-19. 6
É importante frisar que a imensa maioria dos casos da COVID-19 são de doença leve e há diversas medicações prescritas para alívio dos sintomas. Todo paciente diagnosticado com COVID19 deve ser acolhido, devidamente examinado e bem orientado quanto aos sinais de gravidade da doença para que procure assistência médica precoce se necessário. O tratamento de suporte em momento oportuno para casos moderados e graves é fundamental para a redução da mortalidade da doença.
A testagem ampla, com priorização de casos sintomáticos, também é fundamental e permite conhecer o maior número possível de casos, fazendo com que os profissionais de saúde entendam melhor o comportamento da doença, além de possibilitar que os pacientes e seus contatos sejam orientados quanto ao período de isolamento, prevenindo a transmissão para outras pessoas.
Também é dever pontuar que a única forma de prevenção completamente efetiva para controlar a disseminação do vírus é o distanciamento social. Faz-se necessário, infelizmente, que todos tenhamos que nos afastar momentaneamente para o controle da epidemia e para que os hospitais tenham leitos suficientes para atender adequadamente os doentes mais graves. Nas regiões mais críticas, sugere-se atenção especial do poder executivo à implementação de medidas mais restritivas de isolamento para impedir o colapso do sistema de saúde.
O momento é de atenção: não podemos colocar em risco à saúde dos catarinenses com orientações sem embasamento científico e precisamos tomar medidas mais rígidas em áreas com maior risco de lotação de hospitais. A população deve contribuir com o uso de máscaras, higiene de mãos frequente, prática de etiqueta respiratória e distanciamento social, saindo de casa apenas para atividades necessárias.
Até esta data não há medida farmacológica capaz de combater a epidemia apenas o distanciamento social e só focando nestas ações conseguiremos retomar nossa vida habitual com maior brevidade.
Santa Catarina, 13 de julho de 2020.
Thiago Cherem Morelli
Presidente da Associação Catarinense de Medicina da Família e Comunidade
Fábio Gaudenzi de Faria
Presidente da Sociedade Catarinense de Infectologia
REFERÊNCIAS
1. Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina. Avaliação do risco potencial regional relacionado à Covid-19 em Santa Satarina para o dia 07/07/2020. Acesso em 11 de julho de 2020. Disponível em: http://dados.sc.gov.br/dataset/7b4c4ddc-4c6e-4184-9abd-269ed6304a68/resource/2e2babde-d3a3- 4743-9337-7338a18ebe89/download/0707_avaliacao-risco_metodo.pdf
2. U.S. Food and Drug Administration. FDA cautions against use of hydroxychloroquine or chloroquine for COVID-19 outside of the hospital setting or a clinical trial due to risk of heart rhythm problems. Acesso em 01 de julho de 2020. Disponível em: https://www.fda.gov/drugs/drug-safety-and-availability/fda-cautionsagainst-use-hydroxychloroquine-or-chloroquine-covid-19-outside-hospital-setting-or
3. World Health Organization. Q&A : Hydroxychloroquine and COVID-19. Acesso em 01 de julho de 2020. Disponível em: https://www.who.int/news-room/q-a-detail/q-a-hydroxychloroquine-and-covid-19
4. Horby et al. Effect of Dexamethasone in Hospitalized Patients with COVID-19 – Preliminary Report. Disponível em: https://www.medrxiv.org/content/10.1101/2020.06.22.20137273v1.full.pdf
5. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Nota de esclarecimento sobre a ivermectina. Acesso em 11 de julho de 2020. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/noticias/- /asset_publisher/FXrpx9qY7FbU/content/nota-de-esclarecimento-sobre-aivermectina/219201?inheritRedirect=false&redirect=http%3A%2F%2Fportal.anvisa.gov.br%2Fnoticias% 3Fp_p_id%3D101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26p _p_mode%3Dview%26p_p_col_id%3Dcolumn2%26p_p_col_count%3D1%26p_r_p_564233524_tag%3Dcovid-19
6. Sociedade Brasileira de Infectologia. Disponível em: https://www.infectologia.org.br/admin/zcloud/125/2020/06/ddb8adbedf98c5bed371a929338e0df2acc49a f1becb494f5a15dd38f901c760.pdf