A história da medicina versus empreendedorismo na educação

13 de abril de 2017

Por Dijon Hosana, médico de família, membro da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade

O médico é herdeiro da História de sua Escola e toda a Tradição dos médicos que ela formou ao longo dos anos. E esta tradição vai remontar a Hipócrates de Cós e o juramento – hoje já adaptado, mas que ainda rege a deontologia e a ética médica.



Formar médicos deve significar manter viva estas tradições de ética, e é a Escola Médica que deve ser responsável seja em sua constituição regimental, seja através da seleção de um corpo docente que seja capaz de repassar estes ensinamentos pelo exemplo.Mas esta é uma visão de mundo que pode estar morrendo e vê-se isso diariamente entre egressos de escolas privadas, movidas por uma ótica de mercado e lucro.



Olha o que está na página institucional da escola em que estão dos alunos formandos de medicina, no estado do Espírito Santo, que forma tema na imprensa essa semana por tirarem fotos com as calças arriadas e gestos obscenos: " … preparamos o nosso aluno, desde o primeiro dia de aula, para o EMPREENDEDORISMO, pois entendemos que a habilidade de autogestão da carreira e de seu negócio é imprescindível para a conquista do sucesso profissional, independente da área de atuação. Ao se formar, o aluno da UVV estará altamente capacitado para assumir um lugar de destaque no mercado de trabalho." (transcrição literal, incluindo as maiúsculas).



Se a escola traz como valores os do Mercado e não inclui o Humanismo, não será difícil que coisas assim aconteçam e voltem a acontecer. Dentro da ótica do "se eu pago – e caro – por um serviço, posso fazer o que eu quiser dentro da sala de aula, fora dela e representando minha instituição formadora", posso vestir um estetoscópio e um jaleco, por cima de roupas finas e corpos de academia e ‘fazer o que eu quero desde que minha mensalidade esteja em dia’. Afinal, isso é autogestão e empreendedorismo, ou não é?

Claro, poderia fazer isso dentro de um grupo fechado, fascista e misógino, pois todos podem ter, por opção ou ignorância, uma visão de mundo. Mas parece pouco: é preciso exibir o que sinto/sou publicamente para mostrar que posso, que tenho o poder e, por pior que seja, que tenho o direito. A divulgação de tal postura em foto é, assim, misógina, vergonhosa para a comunidade médica e aviltante para pessoas que tem uma formação humanista. Mas, como eu disse, pode ser que estejamos no ocaso dessa ótica.